Delegado reafirma que jornalista pediu investigação sobre José Serra
RUBENS VALENTE
DE BRASÍLIA
O delegado aposentado da Polícia Federal Onézimo das Graças Sousa reafirmou à Folha que o jornalista Luiz Lanzetta --encarregado, até a semana passada, da área de imprensa da pré-campanha de Dilma Rousseff (PT)-- lhe pediu que fizesse investigações sobre o ex-governador José Serra (PSDB-SP).
De Minas Gerais, por telefone, Sousa afirmou que não aceitou realizar as apurações sobre Serra nem fechou o contrato.
Tanto Lanzetta quanto o jornalista Amaury Ribeiro Jr., presentes à reunião, negaram que tal pedido tenha sido feito. Lanzetta deixou a campanha no último sábado, após a revista "Veja" divulgar as declarações de Sousa. Indagado se gravou o encontro, Sousa não negou nem confirmou.
Na entrevista, Sousa disse que se viu alvo de um vazamento de "dentro da casa do PT" e que o assunto, ao ser apurado pela revista "Veja", "foi parar no meu colo".
"Eu me senti na obrigação de esclarecer os fatos."
A seguir, trechos da entrevista.
FOLHA - Gostaria de ouvi-lo sobre a entrevista concedida à revista "Veja"...
Onézimo das Graças Sousa - Foi você que fez uma entrevista com uma pessoa lá da casa? Você viu o que ele falou? Você imagina uma estrutura dessas, uma candidata [importante], talvez a futura presidente do nosso país, monta um escritório onde ocorrem roubos lá dentro. Não pega mal? Quer dizer, eu fui chamado, como policial, para apurar um roubo. E o jornalista [Ribeiro] confirma isso --por sinal foi contratado para fazer isso e não teve competência para fazer. Tanto é, se você olhar na entrevista, são dois tipos de coisas distintas: a primeira eu faço, para seu jornal, sua casa, se você for contratar uma empregada, eu faço: 'Olha, doutor, veja se essa pessoa tem antecedentes'. Isso é uma coisa normal, você faz sem violação a qualquer princípio. Agora, o segundo tópico, que se falou que era para fazer, é que eu não concordei. Aí roubam o meu cartão, dão para a revista e, de repente, põem tudo no meu colo.
Essa segunda parte incluía investigações sobre o ex-governador Serra?
Você há de convir que foi aí que foi o 'xis' da questão. Se você olhar, eu fiz uma carta para a "Veja", em que eu neguei tudo. Eu falo, puxa, 'eu sou advogado, falar que eu trabalhei com o [deputado federal] Marcelo Itagiba, que eu tinha um escritório no Ministério da Saúde', pura mentira, nunca. Se alguém registrar algum recebimento [meu] do Ministério da Saúde eu dou cem vezes mais o valor para uma instituição de caridade. Eu nunca trabalhei no Ministério da Saúde. Falou-se que eu tinha um gabinete no 11º andar. Poxa, então eu vou lá pegar meu dinheiro, eu quero receber.
O sr. nunca integrou aquele grupo da Anvisa que investigava fraudes em medicamentos?
Nunca, nunca, nunca. O meu contato com Marcelo Itagiba foi quando eu ainda estava na ativa [até ano 1995]. Nunca trabalhei sob comando de Marcelo Itagiba. E aí o cara me põe no Ministério da Saúde. Para você ter uma ideia, eu me aposentei em 1995, já se vão 15 anos. Aí ele vem [a imprensa] e me põe trabalhando com [o delegado da Operação Satiagraha] Protógenes [Queiroz] em 2006? Eu estou aposentado há uns 17 anos. Por isso eu não estou falando. Eu respeito o trabalho de vocês, mas fica uma Torre de Babel.
Eu gostaria de saber se o sr. confirma o que está na revista "Veja", de que em determinado momento da reunião, foi pedido que o sr. investigasse Serra.
Veja a resposta que ele [Amaury] lhe deu: 'eram dois serviços, um era proteger a casa' --eu fui lá chamado para isso, problema de polícia, roubo-- 'o outro era saber quem eram esses varas do Itagiba'. É esse que eu não aceitei. Está claro aqui na sua reportagem. Como eu não aceitaria investigar qualquer grupo, meu papel não é esse.
Mas o pedido da equipe da campanha falava no nome do ex-governador?
Veja só: eu te pergunto... Eu confesso a você, passei 30 anos, eu sou um policial, eu não vou pegar uma revista, um jornal, amanhã, e tentar escrever um artigo no seu lugar. Será um fiasco. Eu sou policial. E o que aconteceu foi um jornalista tentando ser policial. Agora, ele, sabedor que eu [supostamente] trabalhei com o Itagiba, que era do PSDB, por que ele me chamou? Era um atestado de burrice, me desculpe. A não ser que você queira dormir com um inimigo.
O sr. é amigo de Itagiba?
Eu o respeito como um colega, trabalhamos na mesma instituição. E ponto final. Agora, veja, ele disse que eu trabalhei com Itagiba, e me chama, me põe dentro do comitê da candidata, que seria o lado contrário de Itagiba? Ele que me levou lá para dentro, então será que ele aprontou isso por incompetência?
Também disseram que o sr. teria dito que tem conhecimento de que Itagiba estava produzindo dossiês sobre o PMDB. Isso procede?
Negativo. Isso era a segunda parte do serviço, como ele afirmou para você. Eram dois serviços. Um era proteger a casa, isso faço para você, para quem quiser. E o outro era saber quem eram esses caras do Itagiba. Sua reportagem é claríssima. E foi o tópico com o qual eu não concordei. Agora, você acha, segundo falam na imprensa, um contrato de R$ 2 milhões, eu precisando trabalhar, eu iria levar isso para a "Veja"? Olha que papel idiota que eu iria fazer. Estou falando com você porque achei suas perguntas inteligentes, só faltou você explorar mais um pouquinho, 'se você sabia que o homem era do Itagiba, por que foi falar com ele?'
Pelo que entendi, eles alegam que quem apresentou o sr. foi outra pessoa.
Negativo. Eles queriam que eu fosse à casa. E, graças a Deus, eu não sou burro, nunca pisei um pé lá e não sei onde é. Aí eles marcaram no restaurante.
À "Veja" o sr. falou em 'coisas pessoais' do ex-governador [Serra]. Ocorreu essa expressão, 'coisas pessoais do ex-governador'?
Veja bem, a partir do momento em que alguém me procura e fala assim, 'doutor, eu quero saber tudo do jornalista 'xis'', eu tenho bola de cristal, eu sou [a vidente] Mãe Diná? Eu não sou Mãe Diná. Não precisa explicitar, né?
Então o sr. confirma que eles queriam saber tudo de José Serra?
Exatamente. Então, para eu saber tudo de você, você sabe qual seria o método. Eu não trabalho com esse tipo de coisa.
Mas, no pedido específico, eles não falaram 'tudo sobre Itagiba', eles falaram 'tudo sobre Serra'?
Exato. Acho que a entrevista, nesse ponto, bate. Outra coisa: a imprensa põe que eu sou dono de empresa. Eu queria que você ressalvasse bem: eu sou um advogado. E advogado não pode falar o que o cliente lhe confidencia. Agora, roubaram o meu cartão e foi parar no colo [do jornalista de "Veja"] com tudo, né? Preste atenção a esse tópico, porque isso é importante.
E o sr. chegou a ver esse cartão?
Foi quando eu fui falar com o jornalista, o jornalista tinha o cartão na mão. Perguntei: 'Onde o sr. conseguiu isso?'. [Ele respondeu]: 'Dentro da casa do PT'. Então o jornalista tem alguém lá dentro.
O que o motivou a dar essa segunda entrevista. Porque no primeiro contato, na primeira publicação, não há exatamente aquelas palavras. O que o motivou...
Veja só. Você viu a carta que mandei para a "Veja", falando do meu papel de advogado? Ora, a partir do momento em que o cliente repassou à "Veja" --o sr. Amaury repassou à "Veja" também, depois que viu a bomba na mão, ele sentou com o jornalista e conversou-- a partir do momento em que o cliente senta e abre o jogo, não fui eu que abri. Então eu me senti na obrigação, também, de esclarecer os fatos. Você viu que são dois momentos. O primeiro momento, o advogado não fala. Agora, se você vem em busca do meu serviço, depois vai na imprensa e põe manchete, 'não, eu procurei o advogado tal' e diz isso e isso, não fui que quebrei.
O sr. tem uma empresa de investigação?
Sou advogado, não tenho [empresa], nunca trabalhei para o Ministério da Saúde. Uma coisa que sei fazer, graças a Deus, é investigar. Investigar eu sei. Trinta anos fazendo isso. Trabalhando contra narcoterrorismo, que é a minha especialidade. Agora, ele mesmo ressaltou, que lá na casa estavam roubando. Eu fui atrás de um ladrão. [...] Primeira pergunta que se faz, quando alguém rouba a sua casa, é quem entrou na sua casa, quem são seus empregados. Eles sequer tinham uma relação nominal de quem estava lá dentro. Quer dizer, é uma casa da Mãe Joana, me desculpe. Agora, como é que se monta uma estrutura para uma candidata e não se preocupa sequer com quem está entrando na casa. Tanto é que a "Veja" pôs [alguém] lá dentro, sentado na mesa.
Há o boato de que alguém teria gravado a reunião. O sr. gravou esse encontro?
Isso é matéria de defesa minha. Ele [Amaury] disse que vai me processar. Eu vou esperar o processo dele. Você não pode gravar conversas de terceiros, mas sua, você pode.
Isso é pacífico que pode, há jurisprudência no Supremo. Mas o sr. realmente registrou a conversa?
Eu prefiro não declinar. Agora, se ele vai me processar... Mas pelo menos ele não negou a reunião, pois eles me chamaram, queriam que eu fosse à casa e eu não fui.
Amigos, volto à tarde. Compromissos inadiáveis.
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